domingo, 13 de novembro de 2011

“Vigilância, o jeito inteligente de viver”

XXXIII Domingo do Tempo Comum – Ano A

Liturgia:

1ª leitura – Provérbios 31,1-13.19-20.30-31

Salmo 127/128

Refrão do Salmo:

Felizes os que temem o Senhor e trilham seus caminhos!

2ª leitura – 1tessalonicenses 5,1-6

Evangelho – Matheus 25,14-30

Aproxima-se o final do ano litúrgico. A Liturgia da palavra coloca o acento no tema da vigilância. O que significa essa vigilância? Um tempo de tensão? Medo? Apreensão? Não. A vigilância a qual se refere à liturgia de hoje se orienta para um “jeito inteligente de viver” a fé e o compromisso que dela deriva.



       A primeira leitura, tirada do livro dos Provérbios, nos apresenta a imagem da mulher cheia de virtudes. Ela é uma benção de Deus para a família. Aliás, surge aqui uma visão nova em relação à mulher, que supera toda uma mentalidade que se desenvolveu dentro de uma cultura patriarcal. Vista, antes, com adjetivos pejorativos, “sedutora, faladeira, ciumenta, curiosa, vaidosa” (Eclo 26,12-36), o autor sagrado, mostra-a como uma joia rara e cheia de qualidades. O texto proclamado hoje destaca quatro qualidades na mulher: 1ª). Ela é uma mulher de valor. É a alegria do marido e da família. 2ª) Ela é laboriosa, isto é, dedicada ao trabalho. Suas mãos têm grande habilidade. Trabalha a lã e o linho com suas mãos para ajudar no orçamento doméstico. 3ª)Ela tem um coração grande, sensível e aberto as necessidades dos  pobres e necessitados. 4ª) Ela é uma mulher religiosa. É fiel aos mandamentos de Deus. Não se deixa levar pelo encanto enganador da sua beleza, pois, sabe que, a beleza é passageira. O texto sagrado reconhece que a sua maior beleza é as suas obras. A pergunta que se faz agora é esta: existem essas mulheres entre nós? Sim, existem muitas e nós sabemos onde encontrá-las. Muitas levam uma vida anônima. Mas a verdade é que, elas estão presentes em muitos espaços das nossas comunidades e são até ignoradas. Aliás, a mulher é símbolo do povo eleito. É também símbolo da Igreja. O novo Israel, isto é, a Igreja, é chamada a cultivar permanentemente uma atitude de vigilância no mundo. Por isso, parece ser “sintomático o fato que, neste domingo, querendo propor-nos um exemplo de laboriosidade (trabalho), de dedicação, de empenho, a liturgia tenha escolhido um texto que nos apresenta a mulher” com suas qualidades ( in Celebrando a Palavra. Ano A. , AM. p.385).



Paulo, grande amigo da comunidade cristã de Tessalônica, tendo tomado conhecimento das suas inquietações em relação ao dia da vinda do Senhor, afirma não ter outra orientação, senão a que foi dada pelo senhor no Evangelho. O dia e a hora ninguém sabe, virá como o ladrão no meio da noite. É por isso que é necessária a atitude da vigilância. Mas, para animar os discípulos de Jesus, Paulo os tranquiliza, lembrando-lhes a condição em que se encontram a partir do batismo, ao fazer a distinção que há entre luz e trevas. O dia que é iluminado pela luz do sol (Cristo, o sol nascente que nos veio visitar), é símbolo da verdade, da clareza, da segurança. Sua luz,  refletida na criação e no coração dos homens e mulheres, permite-nos ter a nossa consciência iluminada pela verdade diante das escolhas e opções que fazemos. Ao passo que, a noite, opondo-se ao dia, ela é símbolo da morte e dos perigos. Ela rouba ao homem a capacidade de enxergar por si só, por isso, ele, com facilidade, mergulha no mundo do prazer e da vida fácil. Totalmente desorientado e seduzido pelo mundo e sua concupiscência, ele pensa ter encontrado a paz e a segurança. Mas não! É aí que soa o grito de dor semelhante ao da mulher que está em trabalho de parto. Uma vida que estava escondida e que foi preservada pelos cuidados e zelo da sua mãe (vigilância) precisa deixar o ventre, isto é, um mundo protegido e sair para enfrentar um mundo desconhecido com muitos riscos e perigos. O cristão vive uma grande tensão no mundo. Mas ele deve lembrar-se sempre da sua nova condição: “Todos vós sóis filhos da luz e filhos do dia!”. Sua vida no mundo deve ser marcada por um grande empenho na construção de um mundo mais justo, humano e fraterno. É aqui que ele é chamado a colaborar na construção do reino de Deus. Do rosto de cada cristão, deve irradiar a luz de Cristo como um farol seguro que, aponta aos homens e as mulheres do nosso tempo, o porto seguro, Cristo. Sua vinda para nós será o momento do nosso desembarque no porto seguro da vida. A leitura nos indica o modo como devemos nos comportar neste mundo enquanto esperamos o Senhor: “numa vigilância consciente e operosa, marcada pela sobriedade no sono, nas escolhas e decisões” (in Vida Pastoral, Nov/Dez. 2012).

Para nos ensinar que a vigilância é vivida no tempo da Igreja, isto é, no tempo desde a ascensão de Jesus ao céu e seu retorno no final dos tempos, o evangelista São Matheus nos oferece a parábola dos talentos que um homem distribui entre seus servos, antes de viajar para o estrangeiro. Na verdade, ele distribui os seus “bens”. Toda a sua riqueza foi distribuída entre seus servos. A essa riqueza ou bens, ele dá o nome de talentos. O patrimônio do homem está avaliado em oito talentos, pois ele dá cinco talentos ao primeiro, dois ao segundo e um ao terceiro. Um talento correspondia a 34 kg de ouro puro ou a vinte anos de trabalho de um operário. A distribuição considera o critério da “capacidade” de cada um e não o das qualidades pessoais, o que levaria a distorção da mensagem evangélica. Feita a distribuição, tem início a grande viagem. Considerando que o homem é Jesus Cristo e que a soma da sua fortuna corresponde a oito (8) talentos entregue aos seus servos, o dia da viagem é o dia da Páscoa. Nesse dia, Jesus confiou a sua Igreja, que recolhe em seu seio servos e servas, o tesouro do Evangelho, para que esse mesmo tesouro fosse dado aos outros. Foi no dia da sua Páscoa que ele soprou sobre seus apóstolos e encheu-os do dom do seu Espírito, enviando-os em seguida, pelo mundo afora, com a missão de percorrer o mundo inteiro, levando o tesouro do Evangelho aos povos e nações da terra. O evangelho é o primeiro tesouro, seguido de outros como a Eucaristia, batismo, perdão e reconciliação e os outros sacramentos. A aplicação e distribuição desses “bens”, proporcionam curas, restauram vidas, libertam o coração da cegueira e das trevas, promovem uma ordem justa e fraterna. Com a viagem, vemos logo os dois primeiros servos aplicados em fazer render os talentos. O lucro é o dobro que receberam. Mas o lucro maior, está por vir, quando se apresentarem diante do Senhor: “Como fostes fiel na administração de tão pouco...Vem participar da minha alegria!”. Agora, a nossa atenção se volta para o homem que enterrou seu talento. Podemos até querer encontrar uma razão para justificar seu receio, como ele mesmo fez. Mas, antes, lembremos que ele não é um coitado, um incapacitado. Também ele recebeu de acordo com a capacidade que tinha para investir. Mas o medo lhe paralisou. Por isso, diz ele ao seu patrão: “escondi o teu talento no chão”. O Senhor semeou no seu coração. Mas ele se deixou vencer pelo medo e preocupações consigo mesmo. Não pensou na comunidade (banco) com suas necessidades. Não quis se comprometer nem participar do processo de construção de uma comunidade nova. Foi um egoísta ao extremo. Por isso, o que pode receber senão colher as consequências do seu amor próprio: “Quanto a este servo inútil, jogai-o lá fora, na escuridão. Ali haverá choro e ranger de dentes!”.

A parábola questiona a falsa segurança de um sistema religioso legalista fechado em si, sem abertura aos outros aos quais consideram pagãos e pecadores, simbolicamente representado pelo homem que enterrou seu talento. Portanto, o personagem que enterrou o talento

por medo do seu senhor representa as pessoas

que permanecem na “segurança” do sistema em

que se encontravam antes de sua adesão à fé

cristã. Representa todas as que estão acomodadas

em seu “ninho”, preocupadas apenas com

o seu bem-estar e indiferentes ao sofrimento

alheio. A comunidade toda é chamada a fazer

render os talentos, isto é, agir de modo criativo,

promovendo relações de justiça e fraternidade.

Esse é o jeito certo de se preparar para a volta

do Senhor. A parábola não é para ser interpretada na ótica capitalista, pois ela não tem a intenção de legitimar a produção econômica em vista do acúmulo de bens nas mãos dos espertos, mas, antes, corrigir as atitudes egoístas e encorajar a prática do amor e da justiça (in Vida pastoral Nov/Dez 2011).

São Bento ensina no capitulo 57 da sua regra como o monge pode dar a sua contribuição para a construção dessa comunidade justa e fraterna quando analisa a produção dos artistas que residem no mosteiro. O produto de seu trabalho seja vendido por um preço mais barato, evitando-se assim, o mal da avareza que gera uma comunidade de explorados e excluídos. O talento de cada um é uma arte a ser colocada a serviço da construção do Reino de Deus.


Nenhum comentário:

Postar um comentário